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APRESENTAÇÃO

Velamos os mortos, mas queremos mesmo é velar a morte. Uma das maiores questões humanas é também aquela para a qual somos menos preparados para lidar. Em nossa cultura, o luto prefere a cor preta da tristeza à possível alvura e leveza do eterno descanso.

Há quem prefira o branco (ou azul) e, com essa clareza, se faz corajosa e abre as portas da compreensão para falar sobre a finitude da vida. É o que acompanhamos neste ensaio narrativo que vem a público dez anos depois que Regina Rapacci viu sua mãe ser consumida por uma rara e indócil doença. Ao lado de sua irmã, Ana, começou a corrida pela descoberta, tratamento para a cura e, por fim, a lucidez para lidar com a dor do outro e de si.

Antes da morte, no entanto, há a vida e seus emaranhados de relações que a mitologia clássica e a psicologia moderna se empenharam em traduzir através de suas histórias e análises. Diante de nossos relacionamentos, falar sobre a morte carnal parece ficar bem mais simples. Afinal, quantas vezes precisamos, simbolicamente, matar nossos pais em vida para podermos encontrar nossos próprios caminhos?

Da relação de Regina e sua mãe, a morte veio para fazer do nó um laço que, organizando fio a fio, fez desse tecido uma forte e atemporal ligação entre mãe e filha. Disso, a tradução melhor do que é o amor de fato.

Do mundo tecnológico e sintético da ciência à lembrança de que somos seres regidos por uma natureza mais forte, havemos de nos lembrar de que – não importa o que nos apoia – ainda somos seres sujeitos à dor e ao sofrimento. E que eles sejam bem-vindos para aqueles que buscam uma vida plena, finita de fato enquanto matéria, mas não necessariamente como memória.

Que a vida se revele.

 

Fred Linardi

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